A Cannabis tem demonstrado um potencial promissor na abordagem dos sintomas do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), um neurodesenvolvimento que afeta milhões de brasileiros. Embora a pesquisa ainda esteja em seus estágios iniciais, estudos controlados randomizados (RCTs) e observacionais sugerem que o Cannabis pode oferecer uma nova via terapêutica para gerenciar os desafios comportamentais e cognitivos associados ao TDAH.

O Papel do Sistema Endocanabinoide no TDAH

O sistema endocanabinoide (ECS) desempenha um papel crucial na regulação de processos fisiológicos como a emoção, o humor e as funções cognitivas. A desregulação do ECS tem sido implicada na fisiopatologia de diversas neurocondições, incluindo o TDAH. O canabidiol (CBD), um fitocanabinoide não intoxicante derivado da

Cannabis sativa, interage com o ECS e outros receptores neurais, como CB1, CB2, Gpr55, TrpV1 e 5-HT1A. Ao contrário do THC, o CBD não tem efeitos psicotrópicos e pode até mesmo atenuar os efeitos agudos do THC.

Pesquisas Atuais e Resultados Promissores

Uma revisão sistemática de ensaios clínicos randomizados (RCTs) que investigaram a segurança e a eficácia do CBD em indivíduos com transtornos do neurodesenvolvimento, incluindo TDAH, foi publicada. A revisão destaca a necessidade urgente de mais pesquisas, mas também aponta para “potencial eficácia” em alguns casos.

Um estudo piloto conduzido por Cooper et al. (2017) explorou os efeitos comportamentais de canabinoides no TDAH. Embora não tenha havido uma redução estatisticamente significativa dos sintomas de TDAH com a administração de Sativex (THC:CBD, 1:1), houve uma melhora observável na hiperatividade/impulsividade e inibição de resposta, com uma tendência à melhora na desatenção e labilidade emocional. Notavelmente, estudos observacionais também sugerem que indivíduos com TDAH podem experimentar menos deficiências cognitivas e redução dos sintomas após o uso de cannabis.

Segurança e Considerações Futuras

Um dos aspectos mais promissores do CBD é seu perfil de segurança favorável, com poucos efeitos adversos relatados. Os efeitos adversos geralmente associados ao CBD, como sonolência, fadiga, diarreia e danos ao fígado, são incomuns.

Ainda assim, a pesquisa sobre o CBD no TDAH e em outros transtornos do neurodesenvolvimento ainda carece de uma base de evidências robusta. A variabilidade nos estudos existentes, incluindo as características dos participantes (idades e perfis cognitivos diversos), os tipos de tratamento (doses, vias de administração, e proporções de CBD:THC), e as medidas de desfecho, dificultam a comparação e generalização dos resultados.

A comunidade científica clama por RCTs maiores e multicêntricos, com designs experimentais e metodologias análogas, para padronizar a duração da administração, regimes de dosagem e a relação CBD:THC. O objetivo é estabelecer perfis claros de segurança e eficácia, e assim, guiar o crescente uso clínico de compostos derivados da cannabis em transtornos do neurodesenvolvimento.

Em suma, enquanto o Dia da Conscientização do TDAH nos lembra dos desafios enfrentados por milhões, o canabidiol emerge como uma área de pesquisa fascinante, com o potencial de oferecer novas e seguras opções terapêuticas para o manejo dos sintomas do TDAH, impulsionando a esperança para pacientes e suas famílias.

Artigos consultados

Parrella NF, Hill AT, Enticott PG, Barhoun P, Bower IS, Ford TC. A systematic review of cannabidiol trials in neurodevelopmental disorders. Pharmacol Biochem Behav. 2023 Sep;230:173607. doi: 10.1016/j.pbb.2023.173607. Epub 2023 Aug 4. PMID: 37543051. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0091305723000941?ref=pdf_download&fr=RR-2&rr=95ec091fb9adfbb2

Cooper RE, Williams E, Seegobin S, Tye C, Kuntsi J, Asherson P. Cannabinoids in attention-deficit/hyperactivity disorder: A randomised-controlled trial. Eur Neuropsychopharmacol. 2017 Aug;27(8):795-808. doi: 10.1016/j.euroneuro.2017.05.005. Epub 2017 May 30. PMID: 28576350. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/28576350/